Anjo disfarçado de leão

 

Mede a altura do tombo

pra calcular o tempo que restará

pra contar quantas magnólias

foram detidas nos dentes

uma tentativa divina de explicar a primavera

para pequenos roedores

a montanha desenhada na nuca

o plano de fuga traçado no sangue

os tornozelos como garças em pontes levadiças

o último sonho com éter de um velho de 20 anos

tentando casar-se com uma ideologia de resgate

amontoando cigarras no peito

contando sua versão de muros grafitados

uma alegria solitária de aflitos

me explicando que o remédio não impede

que a dor orquestre

cada movimento

e altere os ângulos quando o mundo

devora a trama

que não mais sustenta

teu esqueleto suspenso nas alturas

 

Ángel disfrazado de león

 

Mide la altura del tumbo

pa’ calcular el tiempo que le restará

pa’ contar cuántas magnolias

fueron detenidas en los dientes

un intento divino de explicarles la primavera

a pequeños roedores

la montaña dibujada en la nuca

el plan de fuga trazado en la sangre

los tobillos como garzas en puentes elevadizos

el último sueño con éter de un viejo de 20 años

intentando casarse con una ideología de rescate

amontonando cigarras en el pecho

contando su versión de muros grafitados

una alegría solitaria de aflictos

explicándome que el remedio no impide

que el dolor orqueste

cada movimiento

y altere los ángulos cuando el mundo

devora la trama

que no sostiene más

tu esqueleto suspendido en las alturas.

 

Do caráter azul

 

eu sou uma briga na casa de banhos

daquele filme que você assistiu enquanto o mundo desabava

sou a que bate na tua porta de madrugada

para te entregar uma caligrafia obsessiva

e você diz quanto eu merecia uma garrafada na cabeça

mas só desta vez você me deixará entrar

 

eu sou aquela que incendiou teu cobertor cósmico

deu alucinógenos para teus peixes de briga

aquela que não deixa você completar as frases

queimando as torradas e chutando as pombas do teu quintal

não sou má pessoa

só fantasio demais

e cultuo teus desmaios

aos pés da inocência que não tenho

 

tua santidade cínica me comove

e por isto corto por telepatia os freios do teu carro

acordando no teu sofá, gelada e sozinha

vou embora sem me despedir

depois de dobrar o cobertor e agradecer aos peixes

não bato a porta

deixo minha caligrafia obsessiva na parede

e uma desordem nos casacos

 

saio para a lama, para a lua, para o rugido dos girassóis

deixo uma bomba de efeito moral

e uma fotografia de gosto duvidoso

 

você tem razão, teus peixes não gostam de mim

eles sabem que jogo pesado e sempre apanho

são pequenos lunáticos da água que me enxergam abalada

como eles; impregnada de azul.

 

Del carácter azul

 

Yo soy una pelea en el cuarto de baño

de esa película que viste mientras el mundo se derrumba

soy la que golpea tu puerta de madrugada

para entregarte una caligrafía obsesiva

y me dices lo mucho que merecía un botellazo en la cabeza

pero solo esta vez tú me dejarás entrar

 

Yo soy aquella que incendió tu colcha cósmica

les dio alucinógenos a tus peces de pelea

aquella que no deja que completes las frases

quemando las tostadas y pateando las palomas de tu patio

no soy mala persona

solo fantaseo demás

y venero tus desmayos

a los pies de la inocencia que no tengo

 

tu santidad cínica me conmueve

y por eso corto telepáticamente los frenos de tu coche

despertando en tu sofá, helada y sola

me voy sin despedirme

después de doblar la colcha y agradecerles a los peces

no golpeo la puerta

dejo mi caligrafía obsesiva en la pared

y un desorden en los abrigos

 

salgo al barro, a la luna, al rugido de los girasoles

dejo una bomba de efecto moral

y una fotografía de gusto dudoso

 

tú tienes razón, tus peces no me quieren

ellos saben que juego rudo y siempre pierdo

son pequeños lunáticos de agua que me ven afectada

como ellos; impregnada de azul.

 

Anatomia dos lençóis

 

as rasuras coaguladas me aprisionam

em entregas adormecidas

o plano etéreo decodificado nos músculos

siglas enforcadas

esses são os olhos massacrados do amor

 

a tentativa de fuga me espia pela janela

quimeras gelatinosas serrando a mandíbula das palavras

que escorrega dos muros não digeridos

há um pântano no céu de nuvens roxas

 

o que escorre destes tubos alucinados

desperta com a ossatura do silêncio

 

cada víscera dissecada

é o presente que me escapa

nas tardes infantis

em que esquecemos nossos óculos

em abismos apaixonados

 

desconfio que teu bisturi

apronta armadilhas no meu crânio

enfileirado nas paredes de saída

e nosso relatório de conclusões

respira um ar perigoso

 

não há medicina que nos salve

dos corpos desintegrados e magnéticos

que sabem tudo sobre nós

que nos mastiga com ruídos impiedosos

para isso, não há descanso, nem suporte

não há salvação para o cobertor da tua pele

nem para a cortina de órbitas sagradas

esse estudo não tem fim

 

ilhada, adianto as costuras

permaneço fotografando a morte

 

Anatomía de las sábanas

 

las tachaduras coaguladas me aprisionan

en entregas adormecidas

el plano etéreo decodificado en los músculos

siglas ahorcadas

esos son los ojos masacrados del amor

 

el intento de fuga me espía por la ventana

quimeras gelatinosas serrando la mandíbula de las palabras

que chorrea desde los muros no digeridos

hay un pantano en el cielo de nubes moradas

 

lo que chorrea de esos tubos alucinados

despierta con la osamenta del silencio

 

cada víscera disecada

es el presente que se me escapa

en las tardes infantiles

cuando nos olvidamos nuestros lentes

en abismos apasionados

 

desconfío de que tu bisturí

prepare trampas en mi cráneo

enfilado en las paredes de salida

y nuestro informe de conclusiones

respire un aire peligroso

 

no hay medicina que nos salve

de los cuerpos desintegrados y magnéticos

que saben todo sobre nosotrxs

que nos mastica con ruidos impiedosos

para eso, no hay descanso, ni soporte

no hay salvación para la colcha de tu piel

ni para la cortina de órbitas sagradas

ese estudio no tiene fin

 

aislada, adelanto las costuras

permanezco fotografiando la muerte.

 

 

Poemas por Rita Medusa

Traducción por Ayelén Medail